“…Lá vai o trem sem destino, pro dia novo encontrar, correndo vai pela terra, vai pela serra, vai pelo mar, cantando pela serra do luar, correndo entre as estrelas a voar…” Com esses melodiosos versos, escritos pelo poeta e escritor Ferreira Gullar, com inspiração em “O Trenzinho Caipira”, obra do compositor brasileiro Heitor Villa-Lobos, dá-se início a história que ora será narrada, embalada pelo correr do trem em direção a Estação de Caculé.
Passa o tempo, passam-se os anos, transacionam-se os séculos, mas ela continua lá, com sua construção antiga e deteriorada pelo correr dos ciclos que vivenciou e continua a vivenciar. Passam por ela, veias de metal e madeira antiga, levando histórias guardadas nos anais da civilização caculeense, corre nos seus trilhos a modernização sonhada outrora, mas ela, a Estação Ferroviária de Caculé, uma anciã senhora industrial e sem atividade no momento presente, vive fincada nas terras ao lado do rio, marginalizada pela segregação social e sendo objeto de lembranças que o tempo não apagou.
Caculé se estabelece como cidade através do encontro de bondosa senhora Rosa com o guerreiro menino Manoel. E quando eles, personagens fundamentais para a edificação desse sonho de cidade, não estavam mais aqui, em meados do século XX, nos tempos da década de quarenta, nascera à construção da falada Estação Férrea.
Todos unidos, mas com propósitos diversos, foram ver a chegada do primeiro trem, crianças corriam curiosas nas ruas, senhores com seus paletós de linho, a usarem nas suas cabeças chapéus surgidos como moda em época que a guerra se alastrava mundo a fora e senhoras a trajarem vestidos vintâdje, políticos e empresários da época. Homens e mulheres de importância naquela sociedade, juntos em uma grande festa, marcada para a recepção do prelúdio vagão.
Avistaram no horizonte a fumaça no céu, o barulho onomatopéico piui! piuiii! e aquela monumental máquina, a caminhar na linha férrea, a trazer o progresso tão desejado, a depositar nessas terras, novas promessas, novas histórias e novos futuros. Como já dizia a poetisa Adélia Prado “um trem de ferro é uma coisa mecânica, mas atravessa a noite, a madrugada, o dia, atravessou minha vida, virou só sentimento.”
E no seguir da utilidade da Estação, muitos vagões de ferro por aqui passaram, muitas pessoas chegaram, outras tantas se foram, a levarem por essas estradas sertanejas, objetivos, sonhos e recomeços.
E hoje, aqui nas mesmas terras, no viver do século XXI, a Estação ora falada não é mais a mesma, e lamenta em sua construção esquecida, os quereres de reviver, na eterna esperança de novas histórias acontecerem em seu vazio galpão, abandonado pela melodiosa e sonora exposição ao tempo.
Por conseguinte, quanto aos vagões que por aqui passaram, dos mesmos não se tem mais notícias, depois de seguirem seus caminhos labutando nas estradas, morros, vales, rodando a roda do destino por onde passaram, devem, igualmente à estação, estarem esquecidos em antigos galpões, ou ainda a levarem atuais histórias pelos caminhos desses sertões e recôncavos, a cantar suas rodas de ferro pelas veias de outras estações.
Por: Williams Matheus Fernandes Araújo.