Um ex-garçom e ex-barraqueiro, que já chegou a dormir na barraca onde trabalhava, na orla de Salvador, porque não tinha dinheiro para pagar aluguel de um imóvel, vai representar a Bahia na final nacional do concurso Comida di Buteco 2017, que será realizada nesta terça-feira (11), no Solar, do Centro de Convenções SulAmérica, Centro do Rio de Janeiro.
Sandro Rocha de Abreu, de 41 anos, é o proprietário do bar Xique-Xique, em Salvador, e inventor do prato Surubim do Sertão – surubim empanado com quinoa, servido com purê de ervilha, acompanhado de molho -, campeão da etapa soteropolitana do Comida di Buteco. Natural de Xique-Xique, cidade que fica às margens do Rio São Francisco, no norte da Bahia, Sandro conta que quis homenagear o município onde nasceu com o prato escolhido por ele para participar do concurso. “O surubim é um peixe de água doce, muito encontrado lá no São Francisco”, diz.
“Depois que eu defini o surubim, pensei logo na quinoa para empanar. Depois pensei nos molhos. O prato vem acompanhado de quatro molhos – lemon pepper com maionese, lemon pepper com azeite, ervas finas e molho tártaro -, e o cliente tempera a gosto”, conta Sandro.
Esta foi a primeira vez que Sandro participou do Comida di Buteco, mas o caminho que percorreu até o ponto de ser o representante da Bahia em uma competição nacional foi cheio de obstáculos. Ele conta que chegou em Salvador em 1994, aos 17 anos, com um filho de três meses para criar. “Fui trabalhar de garçom na barraca de praia de meu irmão, no Jardim de Alá. Eu dormia na barraca, porque não tinha dinheiro para pagar aluguel na época”, diz.
Em 2007, após mais de 10 anos juntando as economias, Sandro comprou a própria barraca, também em Jardim de Alá, e a batizou de Barraca Xique-Xique. As coisas começaram a melhorar, entretanto, em 2010, a Justiça determinou a demolição de mais de 300 barracas da orla de Salvador, por terem sido construídas ilegalmente na faixa de areia das praias, que pertencem à União.
“Tomei um prejuízo de cerca de R$ 300 mil”, conta Sandro. “Não só pela barraca. Ela não valia isso tudo, mas era dela que eu tirava o dinheiro para investir em outros projetos, como uma casa que estava construindo, e que tive que vender bem abaixo do preço, porque não tinha mais de onde tirar dinheiro”, explica o empresário, que revelou ainda que, nesta época, teve que tirar os filhos das escolas particulares onde estudavam.
No mesmo ano, Sandro começou a retomar o caminho que o levaria ao sucesso. “Um amigo me convidou para abrir um estabelecimento em um ponto dos Barris. As pessoas diziam que tudo que botavam neste local, não dava certo. Eu botei e deu certo”, afirma. Foi quando o bar Xique-Xique foi inaugurado. E o empreendimento deu tão certo, que cinco anos depois ele se mudou para um ponto ao lado, cujo espaço é maior.
“Em agosto de 2015, eu peguei esse bar destruído, e fui pagando dívida, equipando. Tanto que quando fui convidado a participar do Comida di Buteco deste ano, dois anos depois de me mudar, eu a princípio recusei, porque ainda estava tendo muito trabalho, pagando equipamentos, concluindo serviços. Mas depois fui convencido, me inscrevi e, a partir do momento em que me inscrevi, entrei para ganhar”, conta Sandro, que revelou ter feito uma cozinha específica só para preparar o prato do concurso e contratado mais cinco funcionários, que se juntaram aos sete que já trabalhavam no local.
“Foi uma agonia. Você tem que ficar no pé dos funcionários, mas por outro lado é bom, porque acaba treinando eles”, diz Sandro, que aproveitou o concurso para descobrir talentos. “Teve uma funcionária que entrou, e em três dias já pedi a carteira de trabalho dela, porque era muito boa. Em contrapartida, tiveram outros que depois de três dias foram dispensados”, diz.
O empresário revela que após o resultado da etapa local do concurso, divulgado em 1º de junho, a clientela do Xique-Xique, localizado na Rua Rockfeller, bairro dos Barris, aumentou cerca de 30%. “Especialmente a partir de quinta-feira”, diz Sandro. “Na última sexta e no domingo eu tive que sair pedindo desculpas pela demora, porque era muita gente no bar”, acrescenta.
Para ele, a visibilidade e, consequentemente, o aumento do número de clientes foram as maiores premiações do concurso. “O pessoal chega e vira freguês. Entre 10 novos clientes que vão procurar o surubim, pelo menos quatro se tornam fregueses regulares”.