A periodontite pode aumentar o risco de desenvolver a forma mais grave da Covid-19. É o que aponta um estudo feito por pesquisadores do Catar, intitulado “Associação entre periodontite e gravidade de infecção de COVID-19: um estudo de caso-controle”. Ao todo, 568 pacientes foram analisados, sendo que 258 possuíam a inflamação que afeta os tecidos que sustentam os dentes (gengiva, osso e ligamento periodontal).
Os resultados mostram que, entre os 40 indivíduos que tiveram sintomas mais graves da Covid-19, 33 tinham periodontite. A inflamação também apareceu em 29 pacientes dos 32 que precisaram de internação. Entre os 20 que necessitaram de ventilação mecânica, o patógeno bucal se fez presente em 17. Foram contabilizados 14 óbitos por Covid-19 entre os voluntários – 13 vítimas apresentavam periodontite em estágio moderado ou severo.
O doutor Marcelo de Azevedo Rios, professor adjunto de Periodontia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), explica o motivo para a possível relação entre o problema e a Covid-19. “Bactérias que causam a periodontite, quando chegam na corrente sanguínea, são capazes de promover a formação de trombos, um fato observado na Covid-19, ampliando esse risco. Doenças de pulmão são mais comuns em pacientes com periodontite, pois bactérias da boca podem ser aspiradas e provocar inflamação pulmonar. Num paciente com Covid-19, a aspiração de bactérias da periodontite amplia a inflamação pulmonar. Pacientes com periodontite aumentam a presença de ACE-2 na gengiva, e, dessa forma, pode servir como um reservatório do vírus, facilitando sua chegada ao pulmão. O fenômeno que ocorre na Covid-19, chamado de chuva de citocinas, leva a um estado de inflamação importante, e na periodontite o corpo produz bastante citocina, que chega ao sangue e amplia a inflamação presente no paciente com Covid-19”, revela.
A inflamação pode levar, inclusive, à perda dos dentes. Uma certa organização de bactérias adere ao dente e ataca a gengiva, deixando-a vermelha, inchada e com sangramento, especialmente ao escovar os dentes. Se não tratada, a doença avança para o osso que segura o dente no lugar e o destrói. Sem osso, o dente fica amolecido, perde sua função e cai.
O tratamento passa pela orientação ao paciente sobre como higienizar corretamente os dentes. Segundo Marcelo, costuma-se usar raspagem para eliminar o cálculo dentário e modificar a organização das bactérias que causam a doença. Em muitos casos, cirurgias na gengiva podem reverter os danos, ou ao menos ampliar o tempo de funcionamento do dente.
CUIDADOS
A doença não tem cura, e para ser prevenida a saúde bucal tem que estar em dia, com uso correto do fio dental e da escova de dente. “Uma vez que a doença tenha sido diagnosticada, efetuar o tratamento com um especialista e fazer visitas regulares de manutenção são os melhores meios para cuidar da saúde bucal do portador de periodontite”, destaca o especialista.
Ana Carla Robatto, professora da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA), afirma que as visitas para melhor o cuidado da saúde bucal diminuíram em 2020 e 2021, em consequência das medidas de restrição que provocaram o isolamento social. “Estamos vendo agravamento dos casos, mais lesão de cárie, mais casos de periodontite. Eu venho recebendo pacientes com mais tártaro, mais placa. Então com certeza temos mais doenças”, revela.
Como os tratamentos dentários precisam ser feitos periodicamente, o suporte online não dá conta da demanda. “Com o suporte online conseguimos fazer no início, para filtrar, selecionar casos de urgência e aqueles que poderíamos dar uma orientação e esperar um pouquinho. Porém, na odontologia, essa assistência online não é muito efetiva. Se tenho um paciente com dor, eu preciso atuar, para trazer conforto ao meu paciente. A condução online é muito limitada. Se os pacientes estão indo menos para o dentista? Estão. Não só para o dentista. Tudo o que pode ser postergado, está sendo postergado. Seja pelo medo da contaminação ou pelo fator econômico”, conta a dentista.
Robatto ressalva, contudo, que o estudo que associa a periodontite e a Covid-19 ainda não é conclusivo. “O estudo publicado no Catar tinha um tesouro na mão. Lá, os pacientes têm um prontuário único, eletrônico, e toda a parte médica e odontológica está junta. Por isso, eles conseguiram correlacionar a periodontite com a Covid-19. É um dado muito pequeno, porque é difícil termos esses dados todos de um paciente em um mesmo sistema. A gente pode falar, mas não temos dados suficientes para bater o martelo. O que já sabemos é que a periodontite tem relação íntima com doenças cardiovasculares. Bactérias que vão para o coração. Existe uma associação de partos prematuros em mulheres. Também com Alzheimer, diabetes. Existe uma ligação forte da boca com o resto do corpo. Estamos aspirando microorganismos. A campanha para cuidado da boca tem que ser eterna”, conclui.
Bahia Notícias